A Educação Infantil, as Famílias e a Quarentena parte II
- Ana Jacob

- 20 de mai. de 2020
- 4 min de leitura

Gostaria de iniciar esse texto exaltando Graziano Delrio, sujeito pelo qual me admirei após ler o célere capitulo intitulado “Nossa responsabilidade para com as crianças pequenas e sua comunidade”, no livro As Cem Linguagens da Criança (que vale a leitura para os professores). Delrio foi prefeito de Reggio Emilia entre 2004 e 2013, um dos eixos centrais de seu segundo mandato foi: “Uma comunidade forte, um futuro seguro”. Hoje ocupa uma cadeira na Câmara dos deputados e participa do sindicato da cidade.
Não é à toa que Reggio não sucumbiu apesar de toda a desestruturação durante a crise causada pela pandemia do COVID-19. Aos poucos a cidade ganha vida novamente, as crianças estão voltando para a escola e o ritmo de vida mudou, uma nova cultura comunitária está sendo instaurada.
Enfim... voltando a nós e o que podemos beber da fonte de Delrio, são os princípios que este homem descreve ao falar da escola e da educação das crianças, que me remetem a essa loucura que estamos tentando implementar aqui no Brasil, com o ensino remoto, sem pensar nos danos, as famílias, crianças e de forma macro a comunidade. Não faz sentido isso, então retomo aqui, como pais podem reivindicar das escolas uma postura ética, que não leve em consideração apenas poder continuar cobrando as mensalidades, fingindo entregar algo que não está satisfazendo as famílias, ou melhor, não contribui para o desenvolvimento crítico e reflexivo tanta das crianças como dos adultos que interagem com elas.
O primeiro princípio descrito por Delrio é, “A nossa responsabilidade para com as crianças vai além da construção de prédios. Ela se concretiza na qualidade da educação que oferecemos para elas e suas famílias, na qualidade das ferramentas e dos recursos e, em particular, na riqueza da abordagem”. Por si essa sentença se esclarece, mas gostaria de comentar que o que os pais podem pleitear pensando nessa premissa, é que encontros remotos não foram legalizados para crianças muito pequenas, que o Conselho de Pediatria em seu movimento #menostelas #maissaude não recomenda uso de aparatos tecnológicos para crianças menores de 2 anos e para crianças acima de 5 apenas 1 hora ao dia. A tela não pode ser a única alternativa que a escola lhe oferece, aliás vídeos para crianças, os pais poderiam encontrar sozinhos no youtube, lá tem milhares e as professoras de educação infantil têm os replicado aos montes... será mesmo que deveria ser assim? Não descarto encontro remotos em pequenos grupos, para conversar, assim como se faz na prática social, manter o vínculo, compartilhar o cotidiano e falar das frustrações para serem tratadas de um ponto de vista pedagógico.
O segundo princípio trata da responsabilidade ética, “Significa que você reconhece sua dignidade como cidadãos, como portadores de direito relacionados a cidade”. Alguém aqui lembrou de conversar abertamente sobre o que está acontecendo com as crianças, perguntar se elas gostam dos encontros online e ter que fazer “atividadizinhas”? Porque ao invés de demandar atividades a escola não compartilha com os pais conteúdos que possam colaborar com o desenvolvimento social de seus filhos. Lembra daquela pergunta, que sujeito queremos formar? Reprodutores de atividades ou seres pensantes?
A escola, mais do que nunca deveria estar compartilhando notícias boas sobre o momento atual (coisas que vemos com pouca frequência), formas de conversar com as crianças sobre o que está acontecendo ao mundo, reforçar posturas positivas a serem tomadas, atender as famílias de forma individual para colaborar na organização da sua rotina em casa incluindo as crianças, sem pensar em apenas deixa-las ocupadas por um tempinho para deixar os pais felizes. É hora de ajudar os pais superarem os nós que existe na relação com seus filhos... Como eu trabalho com meu filho por perto? Como lido com a birra sem enlouquecer? Quais tipos de materialidades posso oferecer para que ele se concentre por mais tempo? Quais frases posso usar para me comunicar sem ter que fazer chantagem? Os professores são mestres em fazer o trabalho do dia a dia acontecer com crianças por perto, eles deveriam saber orientar vocês nisso.
Cito por último o princípio da responsabilidade política, abordado por Delrio, de uma asserção contextualizada pensando em nossa organização. O aspecto político da educação se cumpre quando está articulada aos compromissos sociais e políticos da comunidade. Políticos e não partidários, ok! Então famílias, caso sua estrutura econômica não tenha se alterado, apesar de você não estar recebendo pelo serviço que pagou, é necessário a empatia de manter o pagamento da mensalidade, o custo das escolas diminuiu pouquíssimo, sem dizer as escolas que saíram gastando com aplicativos para manter os filhos de vocês ocupados e agora precisam arcar com mais isso... caso você precise procure a escola e clame por seus direitos, mas caso você tenha condição, ajude a manter o ambiente da escola sobre menos pressão e stress, pois é esse o espaço que vai receber seu filho depois...
Ah se a escola não se abrir para considerar esses princípios com vocês, então repense se é essa escola que você quer para seu filho? Pois a escola deixa marcar na nossa personalidade através dos princípios que escolhem como guia. Howard Gardner cita o sistema educacional de Reggio como exemplar ao comentar que: “As crianças sentem-se cuidadas pela comunidade. Então, quando elas crescem, elas dão de volta o que receberam, cuidando dos outros. Elas tornam-se bons trabalhadores e cidadãos”. Que sujeitos queremos formar?




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